sábado, 16 de maio de 2020

Por que o ódio ao pensamento é ruim a curto prazo e desastroso para o futuro?

A relativização absoluta da verdade – a concepção de que "se aquilo expressa ou reforça o meu ponto de vista, então deve ser verdade, por mais absurdo que pareça" ou de que "pouco importa se é verdade ou não, desde que defenda minha opinião mesquinha" – é o maior desafio a ser superado pela nossa geração. Nenhum outro problema filosófico é tão iminentemente grave quanto este. E poucos problemas práticos, mesmo socioeconômicos, são tão urgentemente alarmantes.

O maior problema da proliferação de notícias falsas e de discursos esvaziados de lógica não é levar algumas pessoas a acreditar em inverdades. Isso tem alcance limitado e não causa prejuízos para a sociedade como um todo. O maior problema é fazer com que todas as pessoas, incluindo aquelas bem instruídas e de boa vontade, percam parâmetros de verdade, deixem de ter referências seguras de informação. Além do mais, banaliza a mentira, minando não só argumentos que defendem certos pontos de vista, mas destruindo a própria possibilidade do debate. E, sem debate, não há correção, não há evolução, não há interação, não há nada: é só queda.


Isso é levar algumas das partes mais valiosas do ser humano de volta não à Idade Média, como se costuma dizer, mas à própria Idade da Pedra. Sua força de vontade se corrompe, sua imaginação se enfraquece e seus talentos perdem brilho, já que "tudo tanto faz", nesse mundo sem referenciais comuns.


Me entristece demais a quantidade de mentes afiadíssimas que eu vejo, sobretudo nas ciências humanas, tendo de perder tempo para discutir coisas absolutamente ultrapassadas, como "Terra plana", "comunismo X capitalismo" e alguns fenômenos sociopolíticos que eu prefiro nem mencionar aqui para não cair, eu mesmo, nessa espiral descendente de qualidade argumentativa que faz com que todos os conceitos importantes percam seus significados ou tenham seu alcance severamente relativizados em um vácuo de ideologias vagas, contraditórias, mal formadas.


O desmonte de certos conceitos fundamentais do Direito e de princípios estruturantes de instituições sociais conquistados por séculos e mais séculos de lutas e evolução é algo que está fazendo com que os juristas tenham de voltar a ensinar o bê-á-bá para pessoas que supostamente já têm estudos formais superiores. Segurança jurídica e separação dos poderes, entre outros alicerces da própria noção de civilização organizada rumo à paz e ao progresso, estão sendo, dia após dia, esfacelados por uma ignorância que não é apenas "não saber", é um "não sei, não quero saber, tenho raiva de quem sabe e vou agir em todas as negações possíveis de tudo aquilo que me parecer sabedoria". É o equivalente, para as Exatas, se rasgássemos todos os livros desde Newton e Leibniz e voltássemos a estudar a partir do zero os primeiros rudimentos da Geometria (para se ter uma noção, isso faria com que não tivéssemos computadores, celulares, televisões, carros ou mesmo rádios, entre várias outras tecnologias).

É de doer o coração o tanto de gente talentosa que está rebaixando o nível de suas pesquisas e de seus discursos por causa dos contextos da nossa época. Principalmente em redes sociais. Isso sem falar dos jovens que estão deixando de crescer por falta de oportunidades ou de alguém que invista neles ou sequer reconheça suas potencialidades. Eles estão deixando de ter ao menos a oportunidade, a mínima possibilidade, de poder decidir por si próprios entre a razão e a ignorância, ou de tentar construir algo de verdadeiramente positivo para si e para a sociedade.


Pessoas de grande potencial, que poderiam estar pesquisando assuntos avançados, de benefício para toda a humanidade, mas acessíveis apenas a algumas poucas inteligências avantajadas, estão gastando tempo e energia para explicar que "intolerância é ruim", "respeito é bom" e "a ciência tem que ser valorizada". Coisas que deveriam ser explicadas no jardim de infância...

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